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Judiciário começa a receber ações contra ITCMD em estados com alíquota fixa
16 DE ABRIL DE 2025
Uma nova tese sobre o Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) vem sendo levada ao Judiciário. Tributaristas argumentam que todas as cobranças feitas pelos estados sem alíquota progressiva, prevista na emenda constitucional da reforma tributária (EC 132/2023), são indevidas. Juízes de São Paulo e Minas Gerais já analisaram ações do tipo, e a revista eletrônica Consultor Jurídico apurou que outras com a mesma tese estão sendo preparadas em outros estados.
Embora varas de primeira instância do Judiciário paulista e mineiro tenham rejeitado a tese, ela ainda pode chegar a outras comarcas e aos outros seis estados que não se adaptaram à regra da reforma.
O ITCMD, aplicado sobre heranças e doações, é de competência dos estados e do Distrito Federal. A EC da reforma tributária, promulgada em dezembro de 2023, determinou que esse imposto deve ter alíquota progressiva “em razão do valor do quinhão, do legado ou da doação”.
Isso significa que os estados devem criar diferentes faixas de cobrança: a alíquota deve aumentar de forma gradativa conforme o valor ao qual ela será aplicada, com um teto de 8% (estipulado em uma resolução do Senado). Para isso, é necessária a aprovação de uma lei estadual em cada um deles.
Um ano e quatro meses após a promulgação da EC 132/2023, oito estados ainda não aprovaram leis para estabelecer o ITCMD progressivo: São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo, Mato Grosso do Sul, Paraná, Roraima, Bahia e Piauí. Nestes dois últimos, a alíquota atual é progressiva para heranças, mas fixa para doações. Nos demais, é fixa para qualquer situação.
Com isso, tributaristas começam a levantar a tese de que tais estados não podem cobrar o ITCMD com alíquota fixa, já que a reforma tributária passou a exigir alíquota progressiva. Em outras palavras, como a alíquota atual desses oito estados não está de acordo com a Constituição, todas as cobranças feitas por eles desde dezembro de 2023 seriam indevidas.
Constituição x leis estaduais
Leonardo Aguirra de Andrade, sócio do Andrade Maia Advogados, avalia que a EC 132/2023 “não é suficiente para dar fundamento para tal cobrança” nos oito estados que não se adequaram a ela: “É necessária uma lei estadual válida e eficaz para tanto.” A banca avalia mover ações com essa tese a pedido de alguns clientes.
Segundo ele, se a Constituição determina que o ITCMD seja progressivo e a lei estadual não estabelece uma alíquota progressiva, há “uma falta de base legal para cobrança do tributo”, o que deve ser enfrentado pelo Judiciário.
“Progressividade é coisa séria. Não é apenas um método de calculo de um tributo, mas reflexo de uma escolha de como a sociedade quer superar suas desigualdades”, diz o tributarista Paulo Roberto Andrade, do escritório Madrona Advogados, responsável pelas ações ajuizadas em SP e MG. “O contribuinte não é obrigado a pagar, por alíquotas proporcionais, um imposto que a Constituição manda ser pago por alíquotas progressivas.”
Na visão de Everton Lazaro da Silva, advogado do contencioso tributário do Rayes & Fagundes, a EC 132/2023 obrigou os estados a “internalizarem via legislação própria a progressividade do ITCMD, sob risco de se verem impossibilitados de tal cobrança”.
Para ele, “é factível” a cobrança do tributo até 2024, já que a emenda constitucional foi promulgada nos últimos dias de 2023. Mas em 2025, “a inércia dos estados que não alteraram suas legislações internas não pode ser acobertada pelo manto de uma suposta ‘convalidação’, restando, portanto, inegavelmente indevida a cobrança do ITCMD em alíquota única”.
“É necessário que os estados ajustem suas legislações o quanto antes, sob pena de os contribuintes questionarem no Judiciário o pagamento do ITCMD sob uma alíquota fixa”, afirma Juliana Lemos, sócia da área tributária do Trench Rossi Watanabe.
Ela destaca que a EC 132/2023 “não confere uma faculdade ao estado” e acredita que “há elementos para defender a impossibilidade de cobrança legítima do ITCMD à alíquota fixa por ausência de fundamento de validade da norma instituidora respectiva e clara incompatibilidade com a Constituição”.
Chegando às cortes
As primeiras tentativas de emplacar a tese foram malsucedidas. Em setembro do último ano, a 11ª Vara de Fazenda Pública do Foro Central da capital paulista negou um pedido para que os autores — representados pelo Madrona Advogados — não precisassem pagar o ITCMD na alíquota fixa.
Na sentença, o juiz Henrique Geraldo Campos Júnior considerou que “o processo legislativo não extrapolou tempo razoável da elaboração da lei” estadual necessária para aplicação da alíquota progressiva. Ele ressaltou que um projeto de lei com tal previsão foi apresentado no Legislativo paulista um mês após a promulgação da EC 132/2023, embora ainda não tenha sido aprovado.
Já no último mês de janeiro, o escritório sofreu outra derrota, desta vez na 2ª Vara de Feitos Tributários de Belo Horizonte. O juiz Marcelo da Cruz Trigueiro alegou que a alíquota progressiva seria “uma faculdade”, ou seja, opcional.
A banca já apresentou embargos de declaração contra a sentença, ainda não analisados. Paulo Roberto Andrade argumentou, na petição, que a sentença desconsiderou a obrigatoriedade prevista na emenda constitucional da reforma tributária.
Em fevereiro, a 1ª Vara de Feitos Tributários de Belo Horizonte negou uma liminar e manteve a cobrança do imposto a um cliente da mesma banca. Para o juiz Mauro Pena Rocha, “enquanto não houver legislação estadual regulamentando a progressividade do ITCMD, a alíquota vigente permanece válida e exigível”.
Apesar das decisões desfavoráveis até o momento, Paulo Andrade acredita que, “quanto mais perdurar a inércia legislativa dos estados, maiores as chances do Judiciário se sensibilizar com esse argumento”.
De acordo com ele, em 2024 “ainda se podia invocar o princípio da razoabilidade para justificar a inércia dos legislativos estaduais”. Mas a partir de 2025, “essa razoabilidade não existe mais”.
O advogado ainda explica que estipular uma alíquota progressiva não demanda alterações tão grandes na legislação estadual. Por exemplo, São Paulo tem uma alíquota fixa de 4%. Se o estado criasse uma única nova faixa de 3,5%, já haveria progressividade, pois qualquer variação já é suficiente para cumprir a determinação da reforma.
Resistências
Nem todos os tributaristas são adeptos da tese contrária à cobrança do imposto com alíquota fixa nos oito estados em questão. “Apesar de a atuação do constituinte derivado apresentar eficácia imediata, a determinação não torna a cobrança fixa do ITCMD inconstitucional”, diz Leonardo Branco, sócio do escritório Daniel & Diniz Advocacia Tributária (DDTax).
Ele lembra que, desde 1988, a Constituição prevê a progressividade do Imposto de Renda (IR). Mas ela só foi instituída para a tributação do ganho de capital em 2016, e nem por isso a cobrança da alíquota fixa nesses casos foi considerada inconstitucional durante o período de 28 anos entre as normas.
Para Branco, a inovação trazida pela reforma tributária “é quanto ao critério”. A Constituição já previa que, “sempre que possível”, quaisquer impostos devem ser “graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte”. Ou seja, a EC 132/2023 estipulou uma “progressividade específica”, com base no “valor do quinhão, do legado ou da doação” — e não em “sinais presuntivos de riqueza do herdeiro, legatário ou donatário”.
Assim, a regra “não significa veto automático à alíquota proporcional fixa”. O advogado recorda que a própria Constituição prevê a”legalidade como forma legítima por excelência do exercício da competência outorgada ao Estado”.
Já Lucas Babo, advogado associado da área tributária do Cescon Barrieu, afirma que a intenção da reforma era “instituir a progressividade do tributo de forma a aumentá-lo, e não extingui-lo”.
Por isso, ele se opõe a “afastar a exigência do tributo em um período de clara transição, sobretudo considerando que as normas legais permanecem em vigor e muitos estados já iniciaram o processo legislativo para alteração de suas leis”. Na sua visão, a tese “não deve prosperar quando submetida à apreciação dos tribunais”.
Além disso, Babo entende que alguns estados, como SP e MG, já aplicam a progressividade na prática, pois isentam doações e sucessões de valores menores — o ITCMD só é cobrado quando uma faixa inicial é ultrapassada.
Clique aqui para ler a sentença de SP
Processo 1036518-70.2024.8.26.0053
Clique aqui para ler a sentença de MG
Processo 5109884-27.2024.8.13.0024
Clique aqui para ler a liminar de MG
Processo 1000139-49.2025.8.13.0024
Fonte: Conjur
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